MONTAGEM
PENSAR POR MONTAGENS
Aby Warburg foi um historiador da arte alemão que sempre dialogou com outros campos e procurou o que estava escondido ou era descartado pelos outros historiadores e, recorreu assim, à montagem como “forma de conhecimento” e como “imagem de pensamento”. Seu atlas visual era composto por imagens heterogêneas, das mais diversas, que poderiam ser intercambiáveis, sendo montados, desmontados e remontados em função do andamento de seus estudos e sem seguir um estilo argumentativo dedutivo e linear.
Esse pensamento por montagens propõe uma forma aberta de conhecimento processual, construído pela própria prática. Ele admite o conhecimento por relações, associações, choques ou tensões entre as imagens, podendo emergir relações inesperadas e provocando uma série de deslocamentos, inversões, rupturas, descontinuidades e anacronismos.
“O foco de Warburg estaria menos em cada imagem em si e mais no próprio intervalo entre elas, no vazio entre as imagens, nas suas possíveis relações, não estabelecidas a priori, mas que emergem no próprio exercício da montagem.” [1]
Devido ao caráter híbrido e múltiplo de toda montagem, um resultado final fixo não é importante, ela é a própria renúncia do fixar. É uma forma de pensar em movimento e em transformação permanente, que recusa qualquer síntese conclusiva assumindo a incompletude como princípio.
É também um processo de mistura temporal de diferentes narrativas, um procedimento crítico que atua pela sua multiplicidade, pela justaposição de fragmentos distintos que compõe um complexo jogo de forças entre passado, presente e também de propostas de futuro. Essa coexistência de diferentes tempos está evidente na materialidade da própria cidade e podem emergir no presente provocando um choque.
“Pensar por montagens, como diz Didi-Huberman na epígrafe deste texto, seria tornar 'visíveis as sobrevivências, os anacronismos, os encontros de temporalidades contraditórias que afetam cada objeto, cada acontecimento, cada pessoa, cada gesto'. Pensar por montagens no campo da história do pensamento urbanístico também seria pensar por montagens de tempos heterogêneos, 'na contradança das cronologias e dos anacronismos', tensionando as diferentes narrativas urbanas de seus mais diversos narradores, construtores e praticantes das cidades, de tempos distintos. Seria ainda utilizar os farrapos e resíduos, fragmentos tanto narrativos quanto urbanos, como tensionadores de homogeneidades, totalidades e partilhas hegemônicas, aprendendo com as heterocronias urbanas, já e ainda presentes – sobreviventes, materialmente ou não, mesmo que por vezes apagadas, silenciadas ou esquecidas – em qualquer cidade.” [1]
RIZOMA
Continuando o contraponto ao modelo de pensamento linear e cronológico, temos o rizoma, definido e discutido pelos filósofos Gilles Deleuze e Félix Guattari. Este, como as montagens, não se fecha sobre si, é como um mapa que se espalha em todas as direções, se abre e se fecha, se constrói e desconstrói, cresce onde há espaço e possibilidades. Também poderia ser explicado como agenciamentos, linhas se movendo em várias direções, escapando pelos cantos, se atravessando e ultrapassando em diferentes intensidades. Essas linhas também podem ser rompidas em qualquer ponto e a partir dessa quebra abrir múltiplos caminhos e linhas de atuação: circuitos, conjunções, passagens, superposições, etc.
“Um agenciamento é precisamente este crescimento das dimensões numa multiplicidade que muda necessariamente de natureza à medida que ela aumenta suas conexões." [2]
“Talvez o método cartesiano e arbóreo responda bem a alguns problemas, mas basta sair do quarto para perceber as diversas linhas de vida se cruzando incessantemente, desrespeitando todos os métodos. Não podemos mais apostar todos os nossos recursos em pensamentos compartimentalizados. A filosofia nunca foi uma caixinha de saberes determinados, ao contrário, ela é a mistura de todos eles. As conexões se multiplicam, logo, a intensidade também. (...) Se o desejo é uma linha intensiva, então a vida está bem melhor representada no rizoma: tecido feito de múltiplos encontros heterogêneos e disruptivos.” [3]
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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JACQUES, P.B. Pensar por montagens. In: JACQUES, P.B., and PEREIRA, M.S., comps. Nebulosas do pensamento urbanístico: tomo I – modos de pensar [online]. Salvador: EDUFBA, 2018, pp. 206-234. ISBN 978-85-232-2032-7. https://doi.org/10.7476/9788523220327.0009.
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DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. 1995-1997. Mil Platôs. Capitalismo e Esquizofrenia. Rio de Janeiro: Editora 34. 715 pp.
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LAURO, Rafael. Deleuze e Guattari – Rizoma. Razão Inadequada, 2013. Disponível em: https://razaoinadequada.com/2013/09/21/deleuze-rizoma/. Acesso em: Agosto. 2021.
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PELBART, Peter Pál. Rizoma temporal / Peter Pál Pelbart. – São Paulo: ECidade, 2020. 51 p.; Digital – (Outras Palavras; v.5).